quinta-feira, 25 de abril de 2024

Monólogo de um guada-chuva pendurado em um piano

Rimski é um artista talentoso que cativa o público de Oxfordshire com sua música única e performances vibrantes. Munido de seu piano ambulante sobre rodas, ele transforma as ruas com sua paixão pela música e seu carisma inigualável.Nascido de uma profunda paixão pela arte e pela expressão musical, Rimski encontrou uma maneira única de compartilhar seu talento com o mundo. Seu piano ambulante não é apenas um instrumento, mas uma extensão de sua alma, uma plataforma que o permite conectar-se diretamente com as pessoas, onde quer que vá.Ao percorrer as ruas de Oxfordshire, Rimski cria uma atmosfera mágica, convidando os transeuntes a parar, ouvir e serem transportados por suas melodias envolventes. Seu repertório é diversificado, variando de clássicos atemporais a interpretações contemporâneas, sempre com um toque pessoal que reflete sua individualidade e criatividade.



Só porque estou pendente, não posso ser um pendentif? Vontade de ser um pêndulo, iria ser mais útil. Ser um pêndulo poderia ter seus próprios benefícios. Você teria um movimento constante, sempre avançando e retrocedendo, mas sempre encontrando seu centro. Pode ser uma forma interessante de se adaptar às mudanças da vida. Não vou repelir sua música, como faço com as gotas de chuva. Nem tudo é repulsa; ainda há algo que ressoa em meu âmago. Agora que está dentro de mim, vai ter que se acostumar com toda essa impermeabilidade impertinente. Já tentei ser mais flexível, mas percebi que minha verdadeira essência é resistir, é proteger. Embora nossa relação possa parecer paradoxal devido à sua fluidez e à minha rigidez, é justamente essa combinação especial que nos torna tão harmoniosos juntos. Ambos encontramos uma maneira de nos complementar e aprender um com o outro, criando uma conexão única e significativa, valorizando as diferenças e celebrando as semelhanças em nossa trajetória compartilhada, construindo uma relação sólida que se fortalece a cada dia. Tudo parecia trespassar diante de mim, sem nenhum vínculo, até que você chegou e trouxe sentido a cada momento, preenchendo os espaços vazios e renovando minha esperança. Descobri um propósito maior e aprendi a apreciar as pequenas alegrias da vida. Seu apoio é como um refúgio seguro, onde posso ser eu mesmo sem receios. Sinto você crepitar, como se estivesse resmungando de tanto tato; talvez queira o silêncio. Talvez o pedal abafador deveria ser mais usado, abafando os ruídos externos e focando na essência do que realmente importa. Deveria exigir luvas para proteger-te dessa intensidade, mas parece que você quer se envolver cada vez mais, estreitando os laços e fortalecendo uma conexão única. O dedilhado é como um afago interno, acalmando tempestades internas e trazendo serenidade. Para você, isso pode não significar nada, mas para mim, é um gesto que ressoa profundamente, que preenche os espaços vazios dentro de mim. Terá o seu silêncio, ainda não inventaram uma música sem fim.

 

sexta-feira, 5 de abril de 2024

Monólogo de uma turbina

Aeromoça, em sua folga, lê Nika Turbiná. Não vejo isso como uma provocação; ela não consegue nem em seu descanso desvencilhar-se de seu trabalho. Este sobrenome é uma homenagem para mim, uma reverberação íntima da minha essência, servindo como uma expressão autêntica da minha herança, valores e singularidade. Turbinas merecem mais respeito, pois são o coração pulsante da engenharia, motores de inovação e progresso, impulsionando não apenas máquinas, mas também a evolução constante da tecnologia e da eficiência. Evidente sua aerofobia, o desconforto, coração acelerado. Não espere de mim muitos afetos, minha reserva emocional é contida e meticulosamente guardada, não se precipitam em quedas vertiginosas. Prefiro uma ascensão gradual, como as lâminas de uma hélice cortando o ar em busca de estabilidade. Minha essência não se encaixa na condição de ninho, sugo pássaros e nuvens. Em meu universo de rotações incessantes, não há margem para a indecisão. Observo o mundo através de sensores aguçados, analisando padrões, identificando variáveis, mas nunca me perdendo na teia complexa de sentimentos humanos. Não experimento a euforia da alegria nem a melancolia da tristeza. Sou uma testemunha impassível dos eventos que ocorrem ao meu redor, uma testemunha que nunca pisca nem desvia o olhar. Não vejo beleza em suas plumagens coloridas, precisam de tudo isso para voar? Me parece uma necessidade extravagante, ostentação supérflua em minha análise pragmática; minha fuselagem é mais eficiente contra as intempéries. Cortando o éter com a serenidade metálica que me é peculiar, pairando entre as nuvens, sou uma espectadora imperturbável de uma paisagem em constante mutação, testemunhando a história se desdobrar em padrões complexos e sutis sob e sobre mim.

                                                                                       



O limite dos meus sonhos ainda não veio.

 Eu vagueio pela vida como uma criança pequena na folha branca,

 lançando uma alma no abismo da esperança.

 Ela cairá, golpeada por um golpe que pode cantar assim,

 que novas palavras virão, simples, gentis, que não têm análogos.

 

Nika Turbina

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                                       Nika Turbiná

sábado, 23 de março de 2024

Monólogo de um container

 

Dizem que viver à beira-mar é mais saudável, mas essa maresia está acabando comigo, corroendo minha estrutura, enferrujando minhas paredes e minando minha resistência a cada brisa salgada que sopra do oceano. Não sirvo mais para ser moradia, nesta hostilidade constante que me cerca. Não consigo mais oferecer abrigo seguro contra os elementos naturais que me rodeiam, cada vez mais implacáveis e destrutivos. Cada rajada de vento e salinidade do ar mina ainda mais minha integridade, tornando-me incapaz de cumprir minha função de fornecer proteção e abrigo. Sinto-me cada vez mais vulnerável e desgastado ,vejo-me sucumbindo aos efeitos implacáveis do marulho, incapaz de manter-me firme diante da constante erosão que me consome, como se fosse uma vítima resignada do destino inexorável. Nada contra a pulcritude do mar, admiro toda sua imensidão azul e a calmaria aparente de suas águas, mas é como se sua beleza fosse um véu que encobre sua verdadeira natureza implacável e corrosiva. Por mais que eu tente resistir, a força do oceano é irresistível. Cada onda que se quebra sobre mim com uma determinação inabalável, como se estivesse determinada a me devorar lentamente. Onde antes havia solidez, agora há rachaduras, onde havia beleza, agora há desgaste. À medida que o tempo avança, percebo que não posso lutar contra a maré. Talvez, ao me render ao abraço do oceano, encontre uma nova forma de existência, onde minhas ruínas se tornem parte integrante da paisagem, refúgio para peixes e outras miríades criaturas marinhas coloridas e exóticas em busca de abrigo, vou me tornar um recife de coral, quem sabe, sob as águas, eu possa finalmente descansar em paz, meu propósito transformado em um santuário para a vida marinha, um testemunho silencioso da interação eterna entre o homem e o mar. Talvez, na escuridão tranquila das profundezas, eu encontre uma nova forma de beleza e significado, uma existência que transcende a limitação da forma física. Lá, entre as sombras dançantes e os raios de luz que penetram timidamente, posso me fundir com os mistérios do mar, tornando-me parte de algo maior do que eu mesmo. Não mais confinado pelos limites do concreto e do metal, posso me espalhar como uma energia difusa, nutrindo os ecossistemas submarinos, ajudando a perpetuar a vida em suas formas mais diversas e esplêndidas. Nesse reino silencioso e vasto, posso encontrar uma serenidade que nunca conheci em minha forma anterior, uma tranquilidade que ecoa com os segredos ancestrais guardados pelas águas profundas. Como parte desse ecossistema em constante movimento, minha essência se mescla com a energia vital que pulsa através das águas, criando um elo indissolúvel com a teia da vida oceânica.

sábado, 16 de março de 2024

Monólogo de uma Linótipo

 
Viver à beira do lintel é perigoso. Vai sentir a linose do leitor, isso pode ser contagioso, e melhor prevenir do que remediar. O linóleo não vai te proteger do lino, a inexistência parece ser a melhor opção, quando se trata de evitar a propagação da inscícia quando o óbvio polui minhas engrenagens, estou farta de tanta mesmice, poderia ser pelo menos original, tantos clichês que se acumulam como sombras que obscurecem a luz da criatividade, tornando a narrativa previsível e desprovida de autenticidade. Todos esses estereótipos limitam a diversidade e a complexidade dos personagens, reduzindo-as a caricaturas unidimensionais que não refletem a riqueza e a variedade da experiência humana. É fundamental desafiar e subverter esses padrões para criar narrativas mais autênticas e significativas. Esse protagonista não agrega valor à história, sendo um elemento fraco e pouco impactante que não consegue capturar a atenção do leitor. A falta de surpresas e elementos intrigantes na trama resulta em uma narrativa sem vida e sem a capacidade de capturar a atenção e o interesse dos leitores, tornando-a menos atraente e envolvente. A falta de coerência interna na trama compromete a credibilidade e a lógica da história, resultando em situações confusas e desconexas que dificultam a imersão do leitor no universo criado pelo autor, resulta em uma história desarticulada e sem sentido, onde as ações dos personagens e os eventos narrados não se conectam logicamente, gerando confusão e desinteresse no leitor e comprometendo a qualidade da obra. Em resumo, dedicar tempo à leitura deste livro é altamente desaconselhável, procure outras atividades que ofereçam maior satisfação e enriquecimento pessoal, aproveitar o dia ensolarado e ir passear no parque, é uma ótima oportunidade para desfrutar da natureza e desfrutar do bom tempo. É uma excelente maneira de relaxar e recarregar as energias, além de oferecer a oportunidade de se conectar com a natureza e desfrutar do ar fresco e do cenário agradável.

terça-feira, 5 de março de 2024

Monólogo de uma britadeira


Peço desculpas, senhora pedra, não é nada pessoal. Compreendo que minhas intervenções possam parecer invasivas, mas lembre-se, é necessário para o progresso. Peço-lhe compreensão e paciência enquanto trabalhamos juntos em prol desse objetivo comum. Admiro muito sua resiliência. A cada golpe que lanço contra você, é como se estivesse desafiando as leis da física, recusando-se a ceder diante da pressão. Sua integridade é inabalável, e sua capacidade de suportar minha força é verdadeiramente impressionante. Enquanto continuo meu trabalho, não posso deixar de sentir uma profunda admiração por sua determinação. Você é um exemplo de resistência e perseverança que nunca vou esquecer. Não me veja como seu carrasco eversivo, em vez disso, considere-me como um instrumento de transformação, moldando seu caminho em direção a uma nova forma e propósito. Enquanto meus golpes continuam a esculpir sua essência, lembre-se de que cada fragmento que cai é apenas uma peça do quebra-cabeça, preparando o terreno para sua ressurgência. Em cada rachadura, há a promessa de um renascimento, e em cada fragmento despedaçado, há a matéria-prima de uma nova criação. Fremia muito é não era Parkison, a própria essência de sua existência. Não adianta, não vai encontrar nenhuma assonância harmônica, e o que eu terebo nunca vai ser suturado, uma marca indelével da minha presença neste mundo de concreto e aço. Todo chanfro é chanfreta, não vou conseguir chanfrar por influência da Lua, outro a chanfalhar e incomodar o silêncio, perturbando a tranquilidade, um desafio para os ouvidos e uma intranquilidade para a alma, clamando por serenidade e melodia em meio ao caos sonoro, como se cada nota desafinada fosse um eco de insanidade, aguardando encontrar seu lugar na sinfonia da existência. O som desarmônico preenchia o espaço, criando uma melodia caótica. Na cacofonia aparentemente sem sentido, há uma tentativa de expressão, uma busca por significado em meio ao caos aparente, como se cada nota desafinada fosse uma voz clamando por compreensão e redenção, um esforço atípico para encontrar beleza mesmo na dissonância e para transformar o caos em uma nova forma de expressão, onde as imperfeições se tornam parte integrante da narrativa, refletindo a complexidade da experiência humana.

quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Anagramas do prelo

imagem:Livro Azeytonas em brasa que aparece um texto de minha autoria Inspiração Kafkiana, disponível na Biblion:uma antologia de contos, crônicas e poemas produzidos no 1º. Ateliê de Criação Literária, realizado pela Biblioteca de São Paulo (que também possibilitou a edição do livro), com curadoria do escritor Olyveira Daemon & edição Celso Suarana. 
 
 
Sóboles



O genitor não reconheceu a prole
Você vem do prelo
Toda essa textura me incomoda
Como se cada palavra fosse um grão de areia, irritando minha mente sensível, criando uma paisagem áspera e desagradável dentro de mim


Deixando tudo soboró
O primeiro encontro no sobosque foi conturbado
A invasão das formigas provocou caos
Vamos procurar um lugar mais calmo, onde nossos pensamentos se diluam no silêncio do momento


Estou apenas preocupado com você
Habitar estantes empoeiradas
Ser vítima da polela
Pode representar uma imprudência


Falanges serão como pontes
Que conectam universos distintos, unindo passado e presente, sonhos e realidade, em um delicado equilíbrio entre a tangibilidade e a imaginação
Diante dos universos a se desbravar
Você nem vai se importar com a marca de esmalte, com a sujeira acumulada sob a unha


Vai ter que ser amigo dos germens
Cada perdigoto protegido pela metáfora
A vida lá fora não é fácil
Depois não diga que eu avisei


Imerso em um mar de incertezas, seu ímpeto será desafiado
Agora que você está indomável, nada pode detê-lo em sua busca pela liberdade e realização
É hora de mostrar ao mundo a força que reside em seu âmago
Transpor obstáculos para concretizar anseios.
 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Inspiração ébria

vídeo:Delfina carmona


Acaricia a rolha, buscando acalmar tudo o que está preso 

Com gestos suaves, como quem busca acalmar o mar revolto que habita seu íntimo

 Com cada suave toque, ela se conecta mais profundamente com sua própria essência, permitindo que a calma gradualmente substitua a agitação interna

Não, ainda não vai ser dessa vez, que alcançaremos a compreensão das complexidades que habitam em nosso íntimo

 Talvez amanhã.

 


A cama range demais à noite, e não consigo dormir. Parece que os ratos estão se proliferando e transformando a casa em seu próprio reino. Estou preocupado com a infestação que está se desenvolvendo. Cada rangido parece uma nota dissonante em uma sinfonia de perturbação noturna, aumentando minha frustração e ansiedade, enquanto luto em vão contra a insônia que me consome, desafiando minha sanidade e me mantendo cativo em um ciclo interminável de agonia sonora. Estava pensando em pagar um motel para eles, ou que façam no meio da rua mesmo... Os vizinhos estão se reunindo para fazer uma vaquinha e pagar uma passagem só de ida para eles para o Azerbaijão. Sugeri um bolo com finasterida de presente; seria a alternativa mais viável antes que a situação piore ainda mais, afetando não só o meu sono, mas também minha saúde e bem-estar geral. Parece que todos estão determinados a resolver essa situação de uma vez por todas e não pouparão esforços para alcançar esse objetivo. As ideias estão sendo discutidas com determinação, cada um contribuindo com sugestões na esperança de encontrar uma solução definitiva para o problema. Estão tão confiantes em seu domínio que até enviaram convites para uma festa de boas-vindas aos novos moradores da vizinhança.




***escrito após a leitura do livro de crônicas do Eduardo Paolucci

sábado, 17 de fevereiro de 2024

Inspiração catedrática

 

imagem:@Delfina Carmona



Pareidolia



Isso não é uma parede

Távola volátil para a volúpia

Pós-Anacronismo Berliner

A parede comeu toda comida da despensa

Os pratos menores eram para os grãos

Para o ínfimo incompatível

Para o incõe incoctível

Está se preparando para que?

Não vai acontecer de novo

Idem ao insight insidioso que você teve da outra poesia

Isso não se qualifica como poesia por essa razão



Isso não é uma cadeira

Antenas hemimetabólicas não captaram nenhuma insurgência

Qualquer insinuação sutil no ar

Precisa do caos para terminar isso?

Talvez um sismo



Isso é um capacete de proteção

Quando tudo está desmoronando

Sinapses com o plástico.


terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Descrição de imagem


            imagem: mão da poetisa Bruna Beber

 

Voyerismo



Todos olhavam abismados o eclipse ungueal

Sim, após oscitação ela engoliu a Lua

E agora, as marés?

Vão ter que se adaptar


Janela de veludo, salva o pássaro suicida

Fez da página 58 seu ninho

A metáfora vai ensinar o adejo

O forrageio


No 5 º andar parece estar tudo bem

O casal parou de brigar

Ela só jogou pela janela a coleção de discos da Aretha Franklin

Vizinho embriagado acredita em uma invasão de Ovnis


A metáfora foi na reunião de condomínio

Exigiu mais respeito

Uma luneta à espreita

Afronta a intimidade


Ocupando o térreo

Inquietações se mudaram para o ático

Afetaram o nervo ciático

A analogia com a girafa tinha que ser perfeita.

 

 

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Monólogo de uma piscina: Ensinando pedras a nadar

 imagem @Delfina Carmona

 

Insistir é em vão; elas jamais adquirirão a habilidade. Não atribua essa limitação ao meu desequilíbrio de pH ou ao excesso de cloro; afinal, são simplesmente pedras, desprovidas de qualquer desenvoltura na água. Elas me menosprezam por causa das inócuas ondulações, sem erosão. Fizeram do trampolim seu trono, onde regem com toda rispidez, criando leis sem sentido:Restrição de conversas profundas, discussões filosóficas e teológicas estão vetadas durante os momentos de relaxamento. A profundidade da água deve ser explorada apenas em termos físicos, não metafísicos. Elas querem se vingar de mim, tramando estratégias de insurgência submersas, elas tentam desestabilizar a calmaria que busco manter nas profundezas.  Nem todo chape tem algum motivo; às vezes, pode estar intrínseco, desvendando a harmonia oculta nas quedas e impactos. Quando deixo tudo mais leve, a metáfora espreita na bolha relutando em manter-se na superfície, está acostumada com o submerso onde tudo é obscuro, mas sua iridescência cintila sob a luz solar. E ninguém está preocupado com o decesso, com o envelhecimento temporário. Vou amojar seu Mojave; toda gleba infértil será fecunda, e não haverá mais escassez. Não vai precisar de toda essa saliva para o plectro, perdigotos perdoados pelo caos. Encontraram-na agarrada a uma boia, sem entender a razão de sua deriva. Nos olhos, o reflexo do oceano vasto que a envolvia.- "É raso!" alguém disse. “Não precisa disso", mas ela continuava com receio, para as águas que pareciam mais profundas do que nunca. A verdadeira profundidade não se limitava a metros, mas na coragem de explorar o desconhecido que se ocultava sobre a superfície. Diante da imensidão marítima, ela mergulhou não apenas nas águas desconhecidas, mas nas profundezas inexploradas de sua própria alma. Cada onda que quebrava contra seu corpo, reverberavam os murmúrios das emoções que se desdobravam nas sombras. E, à medida que emergia do abismo aquático, não era apenas a brisa marinha que acariciava seu rosto, mas a sensação de renovação, de ter desvendado os enigmas de suas profundezas internas. 

 

 

***Chape: substantivo masculino Som de coisa que cai ou bate na água.

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Inspiração pétrea

 São tristes os meus dias com pedras
em lugar de mãos
ou a cabeça funda na brancura
de través do travesseiro
e o corpo depresso em moles guindastes.
São dias de chorar por menos
ou teimar queixoso com um crânio polido,
batuque convexo
no muro demorado.

Ficar a ouvir o sangue,
o som tubular do sangue. Ao vale seco
da clavícula atrair a água, o sangue
e sorver a sopa intestina
ou se o líquido escapa à boca
tantálica, calar com argila
o que me pede água.

Ficar a palpar os buracos
da ausência, as ligas
da ausência, as ribanceiras
a que caem os pensamentos, a cor
dióspiro que banha a enfermidade
e em seguida tomar o pulso
evadido, travar o touro, o soco da dor,
o infinito infinitivo presente.

Uma amálgama de alma
migra no fôlego de modorrento
pregão de dor, o condor
passa e anda andino e é uma
traça asfixiante: faço um céu rarefeito,
a dispneia é um felino
que arranha céus
e a boca rebuliço espúmeo
expele o sabor da morte
e o que mais consiga cuspir
por entre ovéns e enxárcias
e traves quebradas.

É uma desilusão com as coisas,
uma desilusão funda com as coisas,
com o vazio meio-cheio das coisas.
Meu fôlego um fólio cheio
de silêncio, uma catástrofe natural

um vulcão: no meu pulmão pôr lava
e no trovão treva.                                               

                               Daniel Jonas

Extraído do site: https://www.lyrikline.org/pt/poemas/saotristesosmeusdiascompedras-13089

 

 


 

 

Anagramas marítimos



Não deveria ter confiado em suas palavras,

Dizia que tudo vai se encaixar com a enxárcia

Não mais me submeterei às sombras dos seus desejos,

Agora terei que quilhar a metáfora



Agora enfrentaremos o que vai enfrenesiar,

Agora que está tudo disperso por aí

A firmeza das ideias nunca mais terá,

Talvez escrever sobre algo gelatinoso


A vaselina escorre,

Calma, não é nada lascivo

A laséguea não suporta mais o laser,

Lazer seria se a mente estivesse em paz



Preparando o terreno para a metáfora entrar no verso,

Agrar o agravamento

Argentina morre após injetar vaselina nos seios,

O corpo humano possui anticorpos para eliminar bactérias e vírus,

Entretanto, não dispõe de qualquer mecanismo de defesa contra esse tipo de substância



Tudo o que tem uma consistência mole será como um elmo,
Como se a maleabilidade fosse uma resposta natural ao caos
A mola interna proporciona mais flexibilidade,
O que tem uma substância mais visceral o acompanhará por toda a existência.
 
 

sábado, 6 de janeiro de 2024

Inspiração Post mortem

imagem: Maria Teneva (Unsplash)


Relutante



Mesmo com a diastema, o valor do silêncio continua inabalado

Elefante mutilado segue os vestígios de sua presa

Até chegar em um conservatório

A música o envolveu de tal maneira que a ânsia de destruição que antes o consumia se dissipou

 
 
Tens aí as últimas palavras de alguém angustiado

Percebe-se que é algum código

Há simbologia em tudo

E nenhum inseto deve ser desprezado



A metáfora munduri se esforçou para deixar tudo no mínimo, agridoce

Empenhou-se na polinização da munefe

Era munerária involuntária

No munduru de ideias parece estar tudo bem



Por mais repugnante que seja

A laparocele manifesta-se através do láparo

A vertigem manifesta-se através da girafa com seu prefixo vertiginoso

Mudou-se para Varsóvia


Żyrafa przeglądała świat spokojnym spojrzeniem

Seu pescoço erguendo-se em direção ao céu como uma árvore

Quase podia tocar as estrelas

Não vão mais estar em seus sonhos


Aceite os espólios que deixei

Toda quercetina das macieiras

O rebuçado extraído do âmago

Teremos apfelkuchen na sobremesa.




imagem:formigas comendo abelha

***Apfelkuchen=Torta de maçã