quinta-feira, 28 de abril de 2016

Parônimos Mitológicos



Ilusão

Fagundes Varella

Sinistro como um fúnebre segredo
Passa o vento do Norte murmurando
Nos densos pinheirais;
A noite é fria e triste; solitário
Atravesso a cavalo a selva escura
Entre sombras fatais.

À medida que avanço, os pensamentos
Borbulham-me no cérebro, ferventes,
Como as ondas do mar,
E me arrastam consigo, alucinado,
À casa da formosa criatura
De meu doido cismar.

Latem os cães; as portas se franqueiam
Rangendo sobre os quícios; os criados
Acordem pressurosos;
Subo ligeiro a longa escadaria,
Fazendo retinir minhas esporas
Sobre os degraus lustrosos.

No seu vasto salão iluminado,
Suavemente repousando o seio
Entre sedas e flores,
Toda de branco, engrinaldada a fronte,
Ela me espera, a linda soberana
De meus santos amores.

Corro a seus braços trêmulo, incendido
De febre e de paixão... A noite é negra,
Ruge o vento no mato;
Os pinheiros se inclinam, murmurando:
- Onde vai este pobre cavaleiro
Com seu sonho insensato?...





Dom quixote

Ednei Pereira Rodrigues

Animal de lâmina cortante
Córtex faz do cortelho sua corte
O coletor de cloreto vital
Greip era só uma gripe
Ou panásio de panapaná
Sinais de Isnashi  
Eu ri sem medo de Eurimedon
Seria o salvador dali?
Tudo depende do ponto de vista
Belida beligerante na paz interior
Imbele a pele da catafracta
O coice de foice equina
Pontapés de Argos Panoptes
Ilusão que confunde a mente
E a mesma que contunde o dorso
Não confunda liberdade com libertinagem 
A discrição na descrição foi necessária
Para manter as aparências
Descriminar sem discriminar é inépcia. 

Glossário:

cortelho:curral,pocilga
Greip, Isnashi,Eurimedon,Argos Panoptes:gigantes
belida:mancha no olho
beligerante;referente a guerra
catafracta:armadura que protege o cavalo também



SONETO DA LOUCURA

Carlos Drummond de Andrade


A minha casa pobre é rica de quimera
e se vou sem destino a trovejar espantos,
meu nome há de romper as mais nevoentas eras
tal qual Pentapolim, o rei dos Garamantas.

Rola em minha cabeça o tropel de batalhas
jamais vistas no chão ou no mar ou no inferno.
Se da escura cozinha escapa o cheiro de alho,
o que nele recolho é o olor da glória eterna.

Donzelas a salvar, há milhares na Terra
e eu parto em meu rocim, corisco, espada, grito,
o torto endireitando, herói de seda e ferro,

e não durmo, abrasado, e janto apenas nuvens,
na férvida obsessão de que enfim a bendita
Idade de Ouro e Sol baixe lá das alturas.

Nenhum comentário: