sexta-feira, 1 de abril de 2016

Outono Surreal



Árvore

Fernando Guimarães"Limites para uma Árvore" 


Conheço as suas raízes. É tudo o que vejo.

Há um movimento que a percorre devagar. Não sei

se ela existe. Imagino apenas como são os ramos,

este odor mais secreto, as primeiras folhas

aquecidas. Mas eu existo para ela. Sou

a sua própria sombra, o espaço que fica à volta

para que se torne maior. É assim que chega

o que não passa de um pressentimento. Ela compreende

este segredo. Estremece. Comigo procuro trazer

só um pouco de terra. É a terra de que ela precisa. 




OUTONO SURREAL

Ednei Pereira Rodrigues 

Chega com todo o charme indolente 
Faz a poda e dopa o opaco
Ruma de caruma como lura
Castelo amarelo sem atalaia
Ontem era monte inescalável
Comovente cômoro seco
Outeiro de um Outono
Outorgado pelo áspero desespero
Pele de Alpe intransponível
Servem para forrar algo
Texto revestido de revesso
Reveste de Everest o singelo
Levadas pelo Cierzo
O inverso disperso no verso  
O estro que vem do estróbilo
Gálbulo vocábulo trémulo
Adianta o inverno do inverossímil
Há um certo descontrole em tudo:Efeito Estufa 
Quando tudo é efêmero.




Paisagem
David Mourão-Ferreira"A Secreta Viagem"  

Desejei-te pinheiro à beira-mar
para fixar o teu perfil exato.

Desejei-te encerrada num retrato
para poder-te contemplar.

Desejei que tu fosses sombra e folhas
no limite sereno dessa praia.

E desejei: «Que nada me distraia
dos horizontes que tu olhas!»

Mas frágil e humano grão de areia
não me detive à tua sombra esguia.

(Insatisfeito, um corpo rodopia
na solidão que te rodeia.)

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