sábado, 15 de agosto de 2015

Protesto Surreal

                                                                              
                                                                              

ARENGA

Affonso Romano

félix fúria foice e martelo
cidadão como um cão
danado da vida
porque a vida
está custando
os olhos da cara
porque a vida está cara
como uma joia
porque a vida está
pela hora da morte
repito (eu: vocês)
félix fúria foice e martelo
farto até os bagos
de barriga vazia
promessa não enche barriga
félix feixe de vida
farto da fúria do lucro
feito foice
martela
teu ouvido
chegou a hora
chegou a hora
agora

 Ganância desmedida
Ednei Pereira Rodrigues

Adianta a adiafa considerável do larápio para apiloar o parálio
A propina quita o propileu de seu alcácer
Corrupto corruscuba tem imunidade em Cuba
A cafurna do cafunje é proeminente
Onde se prolifera meliantes do progresso
Cobiçável cobocó do gabiru janota
Que o caboclo apiança em seu prândio
Esmola de sêmola não sustenta sua família
Urumbeva vendível à endívia, ao endível
Caburé comuta o voto por comua
Cabrobó alborca o pleito por alborque
Bacharel oferece a albrecha para preencher uma brecha do estômago
O sufrágio em rágios aumenta o contágio
Impor Imposto ao Impulso
Tributo ao tripúdio moderado
Escrutínio sem escrúpulos com escruncho
O escroto do escroque serve de escudo
Desgoverno da Górgone
Estupidez que estua
 Bruaca para Brunir a Bruma
Gornope como Gorjeta 
Gólgota sem uma Gota. 
Glossário: 
adiafa:gorjeta
apiloar:amassar
Parálio:próximo ao Mar
propileu: Pórtico monumental na entrada de um templo grego
alcácer:palácio
corruscuba:esperto,hábil
cafurna:esconderijo
cafunje:ladrão
cobocó: tipo de queijo
gabiru:rato
janota:bem vestido
apinça:desejar
prândio:refeição 
sêmola:arroz
urumbeva,caburé&cabrobo:caipira
endívia:verdura
endível:tudo o que se pode comer
alborca:alborcar,trocar
alborque:refeição
albrecha:pêssego
rágios:moscas
escruncho:roubo
Górgone,medusa:
gornope:trago de bebida alcoolica
Mulher horrenda, perversa, repulsiva, por alusão às três fúrias mitológicas Esteno, Euríale e Medusa, mulheres que tinham serpentes por cabelos e que transformavam em pedra aqueles que as encaravam.
Golgota: Lugar onde se sofre implacavelmente.


Protesto

 Walmir Ayala, 'O Edifício e o Verbo'

Não é no teu corpo que se imola
para a ceia dos meus sentidos
a vítima núbil, a áurea mola
que cinge o amor recente aos idos.

         Mas é também no teu corpo que corre
         o sangue que o meu sangue socorre.

Não é no teu corpo que se ergue
a guerra fria dos meus nervos.

nem nasceram tuas transparências
para a cegueira dos meus dedos.

         Mas é também no teu corpo insano
         que perscruto meu desconforto humano.

Não é no teu corpo, nos teus olhos
de fauno, que colho as minhas ditas,
nem o jasmim de tua boca flore
para a visão que me solicita.

         Mas é também no teu corpo único
         que o amor à forma do Amor reúno.

Não é no teu corpo que concentro
minha sede (esta sede ferina
que morre de seu farto alimento
e vive de quanto se elimina)

         Mas é também teu corpo a medida
         destas águas sobre a minha ferida.

Não é no teu corpo, mas é tanto
no teu corpo meu último refúgio,
que amoroso e em pânico me insurjo
contra a fonte que és: júbilo e pranto.

         Mas é também no teu corpo o tudo
         da solidão em que me aclaro e escudo.

         Em teu corpo, canal que brande e acalma
         minha alma, este pássaro árduo e mudo
         na estranha migração da tua alma.

Nenhum comentário: