terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Inspiração Sazonal



Notícia Poética: http://bandnewsfmcuritiba.com/2014/11/21/papai-noel-que-cobriu-rosto-de-crianca-em-foto-para-obrigar-pagamento-e-afastado-em-shopping-de-curitiba/




EU, ETIQUETA
Carlos Drummond de Andrade

Em minha calça está grudado um nome
que não é meu de batismo ou de cartório,
um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
que jamais pus na boca, nesta vida.
Em minha camiseta, a marca de cigarro
que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
que nunca experimentei
mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
de alguma coisa não provada
por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
minha gravata e cinto e escova e pente,
meu copo, minha xícara,
minha toalha de banho e sabonete,
meu isso, meu aquilo,
desde a cabeça ao bico dos sapatos,
são mensagens,
letras falantes,
gritos visuais,
ordens de uso, abuso, reincidência,
costume, hábito, premência,
indispensabilidade,
e fazem de mim homem-anúncio itinerante,
escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
seja negar minha identidade,
trocá-la por mil, açambarcando
todas as marcas registradas,
todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
eu que antes era e me sabia
tão diverso de outros, tão mim mesmo,
ser pensante, sentinte e solidário
com outros seres diversos e conscientes
de sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio,
ora vulgar ora bizarro,
em língua nacional ou em qualquer língua
(qualquer, principalmente).
E nisto me comparo, tiro glória
de minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
para anunciar, para vender
em bares festas praias pérgulas piscinas,
e bem à vista exibo esta etiqueta
global no corpo que desiste
de ser veste e sandália de uma essência
tão viva, independente,
que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
minhas idiossincrasias tão pessoais,
tão minhas que no rosto se espelhavam
e cada gesto, cada olhar
cada vinco da roupa
sou gravado de forma universal,
saio da estamparia, não de casa,
da vitrine me tiram, recolocam,
objeto pulsante mas objeto
que se oferece como signo de outros
objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
de ser não eu, mas artigo industrial,
peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente.


Capitalismo
Ednei Pereira Rodrigues

Peculiar ao Peculato
Cabedal Edaz
Bagarote como Baganha
Barganha outra Barbárie
Bagatelas para enaltecer
A barestesia
Permuta a mutação
Mutila o vazio
O mutanje mútico
Multa para a multidão
Coima para a coita
Níquel nivela meu niilismo
Riqueza Ríspida não rítmica
Qual o valor do vão?
Mercenários à mercê do sobejo
Sobrou apenas uma sombra
Nesta Penúria de estro
Devaneios na Penhora
Fragmentos do Frágil
Só uma frase
Uma fração do fracasso
Não vou esclarecer o escasso
Está tudo tão óbvio
O obumbrado para obtundir
Todo esse obstrucionismo
Vestígios de Vestuário
Alguém esteve aqui
Indivíduo Indizível
Indícios da indiferença.








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