sábado, 6 de fevereiro de 2016

Entrudo Lúdrico


Tecido
Gilberto Mendonça Teles"Arte de Armar"

O texto tem sua face
de avesso na superfície:
é dia e noite, sintaxe
do que se pensa, ou se disse.

Tudo no texto é disfarce,
ritual de voz e artifício,
como se tudo falasse
por si mesmo, na planície.

Seja por dentro ou por fora,
seja de lado ou durante,
o texto é sempre demora:

o descompasso da escrita
e da leitura no grande
intervalo dos sentidos.

 
 Disfarce



Ednei Pereira Rodrigues


Sob o emboço a embófia
Indulto ao Induto

Frígida madame macadame
Adiposa betoneira,mistura tudo
Buldogue como buldôzer
Exuma o que exulta
Sítio arqueológico descoberto
Girafa análoga ao poste
Talvez mastro de balandra no bardanal
Haste em contraste com o desbaste
O desgaste de tudo
Esconde minha bruma
Esconde o côndilo
Condição mais favorável ao esquecimento
Já pode começar à se recompor
Recobrar o juízo
Se passar por lúcido
O lúdico não é evo
O frevo não é imbrífero
Camuflagem do flagelo lírico
Paralelo ao desejo
Camuflagem de camurça para a camúnia
Fermenta a fermata que feri o silêncio   
A súplica da plica sem ética
Bemol em prol do silêncio
Toda pujança da puíta pulante.


Glossário:
emboço:Primeira camada de cal ou argamassa que se assenta na parede
embofia:vaidade
induto:vestuário,traje
macadame: Sistema de pavimentação de ruas e estradas com pedra britada e saibro
balandra:embarcação coberta
bardanal:terreno mal cultivado
desbaste: tornar menos basto, espesso ou grosso.
Côndilo: Superfície óssea articular
camúnia: Corja, súcia.
Agrupamento de rapazes.
fermata: Suspensão do compasso, para que o executante prolongue a nota por tempo indeterminado.
plica:Sinal de notação musical.
puíta:cuíca








 

O POSTE
Orlando Brito

Numa esquina plantado, erma e tristonha,
no solo projetando a sombra esguia,
o poste tem cilêncios de cegonha
que cisma à beira da lagoa fria.

É noite, e seu perfil é de um vigia
que, a perscrutar a escuridão medonha,
com seu olho de vidro espia, espia...
Ninguém percebe, mas o poste sonha.

Ao vir do sol, aos claros regozijos
dos pássaros, feliz, ele equilibra
a estrela da manhã nos braços rijos.

Já não é poste de feição tristonha.
É árvore, e floresce, e esgalha e vibra...
Ninguém percebe, mas o poste sonha.     





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