AS PALAVRAS
Adiro a uma nova terra adiro a um novo corpo
As palavras identificam-se com o asfalto negro
o tropel das nuvens
a espessura azul das árvores acesas pelos faróis
o rumor verde
As palavras saem de um ferida exangue
de teclas de metal fresco
de caminhos e sombras
da vertigem de ser só um deserto
de armas de gume branco
Há palavras carregadas de noite e de ombros surdos
e há palavras como giestas vivas
Matrizes primordiais matéria habitada
forma indizível num retângulo de argila
quem alimenta este silêncio senão o gosto de
colocar pedra sobre pedra até á oblíqua exatidão?
As palavras vêm de lugares fragmentários
de uma disseminação de iniciais
de magmas respirados
de odor de gérmen de olhos
As palavras podem formar uma escrita nativa
de corpos claros
Que são as palavras?Imprecisas armas
em praias concêntricas
torres de sílex e de cal
aves insólitas
As palavras são travessias brancas faces
giratórias
elas permitem a ascensão das formas
elevam-se estrato após estrato
ou voam em diagonal
até à cúpula diáfana
As palavras são por vezes um clarão no dia calcinado
Que enfrentam as palavras?O espelho
da noite a sua impossível
elipse
Saem da noite despedaçadas feridas
e são signos do acaso pedras de sol e sal
a da sua língua nascem estrelas trituradas.
António Ramos Rosa
de Gravitações(1984)
A
sombra da árvore na parede do quarto
Galhos
adentro
A
metáfora vai aprender a fazer a fotossíntese
Terei
frutos na jaça?
Pilé
na pildra
Tomara
que não seja jaca
Talvez
Ababone
Abone
devaneios incautos
Amotar
o âmbito
Orgulho
desse cadabulho
Bito
na inópia
Pinoia
de um ramerrame
Ramos
do Pinoguaçu
Eu
lia António Ramos Rosa
O
livro fez de minhas mãos um pedestal
Púlpito
pulsante
Supedâneo
percutâneo
Eu
era a inércia
A
cadência do cadáver.
Ednei Pereira Rodrigues